terça-feira, 26 de julho de 2011

PÁSSARO

Preste atenção, ela disse, ao abrir para mim a porta de sua casa: - o que a gente sonha aqui, tende a acontecer. Pensei que é preciso ter coragem para morar em um lugar assim, onde o que se sonha passa a existir. Precisa ter muita certeza do seu sonho.

Mas não lembro o que sonhei porque acordei, abruptamente, com o barulho de um pássaro que voara em direção ao vidro da janela como se ela não existisse. Assisti sua morte, seu canto de morte. Ele saberia? Janelas novas pedindo, urgentes cortinas. Se a casa fosse minha. Mas. uma casa pode pertencer a mim, substancialmente? eu mesma, tão passageira entre as coisas passageiras?

Ela disse: - eu agradeço por tudo, o tempo todo. - Pela dor também? Eu perguntei. E ela, em resposta, repetia minha pergunta: - pela dor também?

Quis contar do pássaro morto para lhe dar, além do enterro, um pouco de fama. Fama em vida não é bom. É uma espécie de geografia maldita porque quando você está nela, nenhum coração te alcança. O amor que ela oferece é o que te afasta do mundo. Para aceitá-lo só a submissa doçura de quem já morreu. Mas, às vezes é boa a dor porque nos lembra que estamos vivos. - Sim, eu disse pra ela, eu agradeço pela dor também.

- Eu sei uma dor de amor, ela respondeu como quem quer se livrar dela, e começou a contar: - Um dia, ele percebeu, surpreso, que a intensidade do amor que eu sentia, não podia ser verdade, não por ele. Simplesmente não tinha o tamanho dele. Não alcançava, nem de longe, aquele significado todo. Então voou.

- Então foi isso que você sonhou, eu disse. Ela parecia absorta, mas perguntou: - como era mesmo o pássaro que morreu?

terça-feira, 19 de julho de 2011

(...)às vezes precisamos mais.
mais amor, mais toque, mais pele
mais sobriedade sob os ombros
mais madurez ante os passos
mas inevitavelmente precisamos
colocar os olhos adiante.

adiante.

às vezes, simplesmente
precisamos
mais.

Fulminante

Eu me planejei não me planejar. Amor para mim é doideira, descontrole, soluço de árvore na estrada. Andar de cadarços desamarrados, levar os ciscos e as ervas para a casa. Arrastar as folhas e o solo. Varrer a rua em direção à casa, em movimento inverso. Sujar a casa de mundo, de premência. Invejo quem programa seu casamento com antecedência, com dois ou três anos de noivado. Nunca fui assim, de fazer maquete, de brincar de casa de boneca, de planejar cada passo. Família não é uma empresa. Fali na família antes de ganhar alguma coisa. Invejo quem só casa após segurança financeira. Amor nunca me concedeu segurança. Invejo quem condiciona o enlace a uma lua-de-mel no exterior. Que seja na saúde e na doença de cara, na alegria e na tristeza de cara. Relâmpago não é tão bonito sem chuva. Relâmpago sem chuva pede esmola. Quero a chuva junto do clarão, o marulhar das calhas, a água nas escadas das telhas. Sou do amor fulminante, como um enfarte. Perder a razão. Casar na hora, em dias, esquecer que não era possível, esquecer as dificuldades, esquecer os entraves e pormenores. Não dar tempo para criar problemas. Não dar tempo para ponderar com opiniões dos próximos. Não aceitar conselhos de ressaca, decidir ébrio e arrepender-se amando. Ultrapassar-se. Não sei como montei minha casa. Amor junta os pertences, não reclama. Faz funcionar o que não existe. Deixo a demora para Deus, sou mesmo apressado em mim para ser lento no corpo dela. Invejo quem faz lista de presentes em lojas e recebe metade da casa mobiliada depois da aliança na mão esquerda. A aliança nem conheceu minha mão direita. Mal cumprimentou. Não recebi nada que está em casa, não tive poupança, fundos de investimento. Recebo os amigos. Sobrevivi, pois precisava. Não há desculpa para sobreviver. Invejo quem premedita o casamento, conhece os pais dela devagarinho, faz as reivindicações antes do contrato, briga por teimosia e capricho pelo tom das paredes e marca dos ladrilhos. Que escolhe a cor do cachorro para combinar com o capacho. Não consigo. Caso para quebrar as regras, para me aproximar no ato, para não deixar o inferno dourar a pele. Entro no primeiro apartamento e fico. Os livros já são estantes. Ponho o colchão no chão e subo devagarinho com os meses. Caso rápido porque nunca fui sozinho dentro de mim, porque a saliva é água potável, porque amor é urgência. Ajeita-se a vida como pode. Um dia a menos não será depois um dia a mais. Caso em segredo, a dois. Beijo tem muito despudor para ter medo. Não me exibo, caso. Não faço futuro, caso logo para fazer passado. 

Amor Cristão

Amor é a mordida de um cachorro pitbull que levou a coxa da Laurinha e a bochecha do Felipe. Amor que não larga. Na raça. Amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca.
Amor é o tiro que deram no peito do filho da dona Madalena. E o peito do menino ficou parecendo uma flor. Até a polícia chegar e levar tudo embora. Demorou. Amor que mata. Amor que não tem pena.
Amor é você esconder a arma em um buquê de rosas. E oferecer ao primeiro que aparecer. De carro importado. De vidro fume. Nada de beijo. Amor é dar um tiro no ente querido se ele tentar correr.
Amor é o bife acebolado que a minha mulher fez para aquele pentelho comer. Filhinho de papai lá no cativeiro. Por mim ele morria seco. Mas sabe como é. Coração de mãe não gosta de ver ninguém sofrer.
Amor é o que passa na televisão. Bomba no Iraque. Discussão de reconstrução. Pois é. Só o amor constrói. Edifícios. Condomínios fechados. E bancos. O amor invade. O amor também é o nosso plano de ocupação.
Amor que liberta. Meu irmão. Amor que sobe. Desce o morro. Amor que toma a praça. Amor que de repente nos assalta. Sem explicação.
Amor salvador. Cristo mesmo quem nos ensinou. Se não houver sangue. Meu filho. Não é amor.

*Do livro: Rasif - O Mar que Arrebenta

quinta-feira, 9 de junho de 2011

lembrando.

Apaixonada por Chico Buarque, eu só queria um desculpa para escutar, lembrar, sonhar. Quem disse que a alma não tem voz, não me conhece.


terça-feira, 7 de setembro de 2010

CÁ PRA NÓS!

Nosso amor é valentia
sem lugar para covardes
só o querer que acende
Cá pra nós tanta besteira
vem cá meu benzinho
eu vivo perdido
com calma te explico
não sei o caminho...

Pede a conta enquanto é tempo...

Amor em Jacumã.

vou dar uma bola
vou levar a minha nêga para jacumã
ver o sol nascendo na ladeira
anunciando que já é manhã
se chegar turista eu estando lá não quero ver
se chegar artista eu estando lá não quero ver
se chegar revista eu estando lá não quero ler
só quero ver a onda alegre subindo e descendo
e eu também com ela subindo e descendo
e a nêga comigo nesse vai e vem
nada de disse me disse
tudo na paquera
amor não é tolice
conversa já era
lá em jacumã ninguém conversa não
vou pra já, pra já
pra jacumã

 
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